domingo, 9 de dezembro de 2012

Programa Nacional de Estabilização Geral das Pessoas e das Coisas



Era uma vez um Burocrata chamado The Patent. Ele decretou que no seu país tudo seria classificado. Tudo haveria de ter peso e medida.

Construiu um supercomputador que fazia milhões de cálculos de uma vez só, inclusive calculava os cálculos de todos os outros computadores juntos. Contratou outros burocratas como ele, e determinou a toda a população que se dirigisse ao Escritório no Planalto Central para pesar e medir o que tinham.

Filas enormes, requerimentos idem, taxas e carimbos, marcavam na História o glorioso momento de dar-se Peso e Medida a tudo.

E todos traziam todas as coisas. Desde penicos e navalhas de barbear até fornos microondas, passando por charretes e patinetes. E para pesos iguais, códigos iguais; medidas iguais códigos também iguais. E isso é óbvio. Tudo que era visível foi medido e pesado, carimbado e autorizado a existir.

Sim, diga-se isso, pois fiscais rigorosos andavam por todo o país pedindo carimbos e alvarás de existência para tudo. O que não tinha alvará era considerado sem peso e sem medida e era imediatamente destruído, pois transgredia a singela lei de que tudo tem que ter um peso pesável e uma medida medível, caso contrário não existe.

E para aumentar a velocidade de pesar, medir e classificar proliferou no Planalto, cursos para formação de Doutores Pesadores e Medidores. Já nem eram necessários os Aparelhos Dimensionadores Gerais. Os Doutores desenvolveram tantas habilidades que os permitia apenas olhar e já pesar e medir. Esta chave: dois gramas e três centímetros! O balde: oitocentos gramas e 50 centímetros. E assim aumentou-se a velocidade da classificação de tudo e em pouco tempo todas as coisas do país estavam pesadas e medidas.

Agora era apenas manter. E daquele dia em diante tudo que fosse montado em fábricas já sairia pesado, medido e com licença para existir.

Neste momento o burocrata, The Patent,  percebeu que seu Programa Nacional de Estabilização Geral das Pessoas e das Coisas poderia acabar. Ora, se tudo saísse das fábricas já pesado, medido e com licença para existir seu Instituto Nacional de Pesagem e Medição se tornaria inútil.

Teve a idéia! Medir-se-ão e pesar-se-ão também os pensamentos e as palavras. Com esta providencia haveria de garantir a existência de seu Instituto de Pesagem e Medição até o final dos tempos. Pois pessoas não param de nascer, e mais, pessoas não são montadas em fábricas e acrescente-se: pessoas sempre querem mudar de pensamentos e palavras. E por fim a expressão "Pessoas" já estava incluída no titulo de seu Programa.

Foi decretada, pois a obrigatoriedade de todos comparecerem ao Escritório do Planalto Central a fim de receberem os alvarás de seus pensamentos e palavras. Receberiam o CPMPP - Certificado de Peso e Medida de Pensamentos e Palavras - válido por cinco anos e obrigatoriamente renovável.

E para o Escritório do Planalto Central passaram a dirigir-se as pessoas sozinhas, aos pares e em grupos.

Para a Certificação de Peso e Medida dos Pensamentos e Palavras das pessoas sozinhas não havia nenhum problema. O processo era rápido.

Mas para aquelas em pares ou em grupos surgiu um imprevisto. Colocados frente a frente, os indivíduos de um par ou de um grupo traduziam seus pensamentos como, embora iguais no conteúdo, diferentes no sentido. O mesmo acontecia com as palavras: haveria que se considerar tom de voz, circunstancia, nível socioeconômico, grau de relação entre transmissor e receptor e assim por diante e por último, o significado propriamente dito da palavra. Para só depois pesá-la e medi-la.
Diante destas divergências e da conclusão óbvia da necessidade de mudar o Programa Nacional de Estabilização das Pessoas e das Coisas para Implantação Extraordinária e Provisória da Igualdade de Pesos e Medidas das Palavras e dos Pensamentos, os Doutores em Pesos e Medidas fugiram para um convento tibetano.

O supercomputador declarou-se incapaz para essa tarefa e daquele dia em diante dedicaria seu tempo a imprimir desenhos para as crianças colorirem.

O Burocrata, The Patent, mudou-se para uma cidade do interior onde vende sequilhos e bombocados na Praça da Matriz. O tamanho e o peso do saquinho do que vende é a gosto do freguês.

E o povo festejou e dançou durante três dias e meio, jogando para o ar, papel picado que fizeram do Certificado de Pesos e Medidas, comemorando o fim da avaliação das coisas, pensamentos e pessoas! A anarquia transformada em alegria ampla, geral e irrestrita.

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